Antes de poder explorar a questão da greve nacional da educação que está ocorrendo tanto com os Técnicos Administrativos da Educação quanto com os professores, quero que leiam a seguinte frase do livro ABC do Socialismo, organizado por Bhaskar Sunkara, Aline Klein e Victor Marques, e reflitam.
“A luta de classe muda as ideias e os preconceitos das pessoas e forja novos laços de solidariedade na classe. Lutas da classe trabalhadora tendem desempenhado um papel central na conquista de vários corpos oprimidos na luta contra um opressor comum”
Desde o dia 11 de março, os Técnicos Administrativos da Educação (TAE’s) das universidades, institutos e colégios federais entraram em greve, e posteriormente, a partir do dia 15 de abril, os docentes também deflagraram greve, unindo-se aos TAE’s em prol de melhores condições de trabalho. No dia 11 de junho, os TAE’s completarão três meses de greve, e os professores completarão dois meses no dia 15 de junho. Cabe destacar que os TAE’s constituem uma das categorias com o pior piso e teto salarial do funcionalismo público federal.
Durante este período, ocorreram negociações com o Governo Federal, especificamente com o Ministério de Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), resultando em duas propostas para os docentes e técnicos. No entanto, nenhuma dessas propostas atendia aos interesses das duas categorias, pois não previam nenhum reajuste salarial para este ano, algo que ambas as categorias estão reivindicando durante esta greve.
Ao longo deste período de greve, diversos mecanismos de desmobilização e encerramento da greve foram impostos a essas categorias pelo sistema capitalista e pelo Governo Federal. Esses mecanismos variam desde a circulação de pensamentos que questionam o motivo da greve, gerando conflitos internos entre as classes, até estratégias de negociação separadas para diminuir a força conjunta dessas duas categorias.
Ao acompanhar toda essa situação, deparei-me com comentários chocantes entre alunos, professores e a sociedade em geral nas postagens das redes sociais dos sindicatos. Isso inclui xingamentos, desmoralização dos docentes, questionamento da produção de conhecimento e outras ofensas pesadas.
Afirmar que essas propostas contemplam essas categorias é não ter noção da realidade e da importância dessas categorias para o desenvolvimento social, político e econômico do país. Dizer que o salário dos professores é suficiente é inadmissível. Como pode um(a) professor(a) com graduação, mestrado, doutorado ou pós-doutorado receber menos de 13 mil reais? Como podemos aceitar que um professor com duas graduações e pós-doutorado receba menos de 6 mil reais? Este é o caso de um docente com contrato temporário na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), como se pode verificar no portal da transparência.
Cabe destacar a disparidade de conhecimento e salarial entre duas categorias do funcionalismo público: juízes necessitam apenas de uma graduação em Direito e três anos de prática jurídica, além de outros requisitos não tão exigentes, e têm piso salarial de 30 mil reais. No entanto, sabemos que um juiz frequentemente recebe muito mais que o piso, às vezes com remuneração dobrada, diferente de um professor que, para tentar se igualar ou se aproximar desse piso, deve dedicar muitos anos ao serviço público e envolver-se em diversas atividades além de suas atribuições básicas.
Salienta-se que as três categorias (PF, PRF e PP) obtiveram um reajuste significativo este ano sem necessidade de greve, o que é bastante estranho, não é?
Chega a ser paradoxal os discursos proferidos pelos progressistas e até mesmo pela esquerda sobre a educação ser a transformação de realidades, de pessoas e de um país, enquanto a cada ano a educação se torna mais precarizada e entregue ao setor privado. Isso inclui a retirada de recursos públicos que deveriam ser investidos na educação pública, mas estão sendo destinados ao setor privado.
Isso foi comprovado na tese de doutorado de Fernanda Cosme da Costa, intitulada “FIES, PROUNI e PROIES (2003/2009): valorização do capital no ensino superior”, onde foi relatado que entre 2015-2023 o orçamento para o ensino superior público foi de 287 bilhões, comparado a 446 bilhões destinados ao ensino superior privado. A cada dia, a educação é mais atacada, seja pela precarização do trabalho dos professores, pelas péssimas condições de infraestrutura dos locais de trabalho ou pela falta de recursos para o funcionamento das instituições.
Outra crítica que chega a ser extremamente ridícula é dizer que o momento agora não é adequado para a greve. Diante disso, eu questiono: existe algum momento adequado para deflagrar uma greve? Se esperarmos pelo momento ideal, ele nunca chegará.
Além disso, outro ponto a ser questionado durante este momento de greve é o silêncio ensurdecedor dos progressistas e da esquerda brasileira. Até o momento, não vi pessoas de notória influência política juntarem-se à causa das categorias e exigirem do Governo Federal uma solução, nem vi cobertura na mídia nacional, controlada pela burguesia.
Durante a época eleitoral, uma das estratégias do Presidente Lula foi afirmar que a educação seria prioridade, atraindo votos do campo acadêmico. Contudo, chega 2024, após um ano e seis meses de gestão, e a educação não está sendo priorizada, com professores e TAE’s indo a Brasília exigir condições mínimas para trabalhar. Se a educação fosse realmente prioridade, não teríamos greve neste momento, nem docentes e TAE’s em Brasília negociando. O discurso é retórico, mas a materialização não existe.
A greve consiste em um movimento político onde uma determinada classe trabalhadora se une através de seu sindicato para reivindicar melhores condições de trabalho. Logo, a greve nacional da educação federal reflete e prova que a educação brasileira está em decadência, evidenciada pela precarização da mão de obra dos trabalhadores, das infraestruturas das universidades e pela falta de recursos para manutenção e funcionamento das instituições.
Ao analisar e observar toda essa situação, parece-me que essas categorias que estão reivindicando melhores condições não são valorizadas pelo Estado. É colocar essas categorias contra a própria sociedade e dizer que o que estão fazendo é birra. É pegar toda a mão de obra, esforço e conhecimento produzido e jogá-los no lixo. A educação não é prioridade em nenhum momento, exceto na época eleitoral. É lamentável tudo isso que estamos passando e desejo força aos docentes e técnicos administrativos da educação.